As bruxas também pagam contas

Lua Cheia, 5 maio 2023

No conto “A tentação de Sto. António”, Donald Barthelme comenta as expetativas dos habitantes de uma pequena cidade contemporânea face à vivência da espiritualidade. Num tom aparentemente neutro, que acentua ainda mais o humor delirante do texto, o narrador de primeira pessoa relata as manigâncias a que se entregam os seus concidadãos, na tentativa de provar que o santo era uma farsa. Embora a maioria até goste dele, as pessoas sentem-se um bocado irritadas com a ideia da santidade, e acham que o santo devia era arranjar trabalho. Os vizinhos tocam à campainha no mero intuito de espiar os seus hábitos, e quando o santo os convida gentilmente a entrar e lhes oferece um café, aproveitam para espiolhar o apartamento, ficando chocados ao descobrir que, afinal, ele não se alimenta de ervas e raízes e até abusa dos fritos e, para mais, horror dos horrores, dorme numa cama e não no chão. A vida já é dura o suficiente sem nos atermos nas mais altas ordens de abstração, assevera o narrador, pelo que é perfeitamente compreensível a dificuldade da maior parte das pessoas em imaginar o inefável.

Há uns meses, num contexto social, cruzei-me com um tipo que se mostrou desconfiado quando as pessoas ligadas às artes da cura pedem dinheiro, argumentado que tal prova serem mesquinhos os seus motivos. De facto, continuamos todos a acreditar que as bruxas vivem do éter e, no supermercado, trocam feitiços por bens de primeira necessidade. Os saberes esotéricos são considerados com um misto de espanto e dúvida, e, para esquecer a tristeza, as pessoas preferem beber um copo, ou comprar algo inútil, do que investir numa sessão de terapia energética. Antes curtir a ressaca de uma noite ruidosa, ter qualquer coisa para agarrar nas mãos, do que buscar uma chave em dimensões subtis.

Por outro lado, é curioso ver como muitos terapeutas também lidam mal com a matéria, e pedem contributos tímidos, sugerindo aos clientes que deixem o pagamento na caixinha, ali ao canto. Continuamos reféns da ideia do resgate, crentes de que devemos servir abnegadamente, sacrificando o nosso bem-estar em prol do coletivo. Acreditamos que o dinheiro é sujo, e lamentamos a falta dele, em vez de bendizer a abundância, que passa pela justeza das trocas ao nível da matéria.

Será talvez tempo de resgatarmos o respeito pelo saber alternativo, construído através de percursos iniciáticos que incluem práticas meditativas e comunhão com as forças da natureza, em longas aprendizagens com vários mestres. Sim, seguramente haverá por aí muitos charlatões, como em todas as áreas existem pessoas enganadoras e incapazes. Caberá a cada um afinar a intuição para aferir se a proposta que lhe oferecem é válida, pois há, por certo, respostas para todos os gostos, ofertas que vão de encontro aos requisitos da diversidade. Sim, as bruxas também pagam contas e é importante respeitar e retribuir o seu trabalho.

Adenda: Estou ciente de que várias outras áreas sofrem com esta maldição, sendo também comum as pessoas esperarem que os artistas passem fome pela musa e ofereçam o seu trabalho em jeito de divulgação, que professores, enfermeiros e médicos sacrifiquem a vida pelo sentido de vocação, etc., etc. Contudo, no paradigma materialista em que vivemos, aqueles que se dedicam aos campos mais subtis padecem deste mal exponencialmente e não se organizam em sindicatos.

#image_dianavalmeida Portable altar. Açores, Summer 2021.

sobre o meu trabalho

O meu serviço centra-se em três áreas — Energia, Criatividade e Visão. 

Ofereço uma terapia holística, combinando energia, taças tibetanas, cristais, sinergias de óleos essenciais personalizadas e (se a tua pele quiser ser tocada) massagem intuitiva — Afinar o Coração. 

Proponho workshops de desenvolvimento humano, unindo escrita e meditação, ou mentorias criativas individuais para desenvolveres um projeto de escrita ou trabalhares um tópico específico — Escrever o Coração. Em breve, será anunciada a data de um workshop (presencial, 1 dia) sobre tranquilidade. Neste âmbito, co-organizo também, com a Maria João Ferraz, caminhadas meditativas em silêncio na Serra de Sintra — Caminhar no Coração (a retomar em junho, devido a um acidente sofrido pela nossa guia).

Realizo rituais fotográficos que honram a beleza singular de cada Ser — Retrato Sagrado e Corpo Vivo: Deusa Grávida.

Dou também aulas de Kundalini Yoga, terça, das 18h30 às 19h30, na Casa Pavan, em Fontanelas (Sintra)!

Queres saber mais, ou marcar uma sessão? Entra em contacto comigo.

Bem-hajas!

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